Lembro-me muito bem quando toquei por lá na primeira vez, ainda com a banda Cuatro, em Agosto de 2009. Logo na entrada, ali na varanda e na pequena arquibancada, eu vi as pessoas bebendo e aguardando. Estava cheio de gente, e tinha famílias inteiras por lá, até crianças. O palco no início era improvisado, no chão mesmo, ali no canto de um dos cômodos, parede em cor azul, logotipo do bar acima de onde encontrava-se a Bateria. Fios, cabos e tomadas por todos os lados, a gente pulava com o som e a adrenalina da música e pra não tomar choque também.

O Espaço Rock bar ficava na deserta e escura rua Hoffman, ali no número 723 no Bairro Santa Cruz. Por 10 anos, desde a inauguração em 2007 e o encerramento das suas atividades em 2017, esse foi o endereço mais underground da região do Barreiro. Seja na abertura do bar nas noites de sábado ou nas tardes de domingo, eles estavam lá, Graciano Lázaro, mais conhecido como Grá, Reginaldo e um monte de camisas pretas. Ocupavam desde cedo a varanda em telhado colonial, a calçada em frente ao bar e até mesmo a rua, eles estavam lá, davam uma outra tonalidade de cor ao fim de tarde no Barreiro.

Já na sua placa com o logotipo em azul, preto e branco temos o desenho da lendária guitarra da Gibson, a Flying V, lançada em 1958 e desenhada pelo então presidente da corporação Gisbon, Ted McCarty, visionário ele buscava uma guitarra com um designer mais moderno pra época. O Espaço Rock bar nasceu de uma visão, de um desejo de dois amigos, amigos de longa data, diga-se de passagem.

Graciano e Reginaldo que trabalharam juntos em uma empresa em Betim, tinham a ideia da abertura de um bar. Eles já se conheciam desde a adolescência, quando ainda corriam pelas ruas do Teixeira Dias, Milionários, Vila Cemig e Santa Cruz. Ambos, apaixonados por música formaram a banda Homo Sapiens e com a abertura do bar utilizavam esse espaço para expressar sua paixão pelo bom e velho rock n´roll.
Eles não sabiam ainda, mas estavam criando um espaço de oportunidades, um local de referência, onde os músicos da região do Barreiro mostrariam seus trabalhos ao público local.

Sabemos que o início de qualquer empreendimento é sempre difícil, e para a gestão de um bar não seria diferente, ainda mais com artistas e bandas na sua agenda. As vezes a demanda inicial de público não é a esperada ou em alguns casos excede as expectativas. Corre atrás de bebida ali, falta salgado, batata frita e feijão tropeiro aqui, mas era feito de coração, na raça mesmo. Isso tudo fez do Espaço Rock bar um local bem acolhedor, um ambiente para reunião de amigos e familiares.

Os vizinhos sempre atentos, logo notaram e olhavam com desconfiança nos primeiros anos de atividade. Mas a partir do momento que perceberam a seriedade do trabalho e o movimento que passou a agitar a rua Hoffman, antes deserta nos finais de semana, acabaram se acostumando com a ideia, com o som alto e a presença dos roqueiros de plantão.

As vezes que toquei no bar com a banda, Graciano e Reginaldo deixavam a gente sempre a vontade, aquela coisa de mineiro, a casa é sua, o palco é de vocês. E realmente era assim mesmo. A gente ficava sempre de boa tocando no Espaço Rock bar, e sempre a gente ouvia aquele, toca mais uma! O público sempre respeitou as bandas e artistas que passaram por lá. Em nenhum momento fui ofendido ou desrespeitado. O público apoiou sempre as músicas autorais, gostando ou não eles respeitavam a gente.

Com o passar dos anos o Espaço Rock bar foi ganhando público, credibilidade e bandas começaram a se destacar no seu palco. Já tinham lugar garantido na sua agenda bandas como a Ponto 80, Gordini 69, Seu Silva, Militia, Efecto, Locomotiva, Marcelo Villas (hoje Marcelo Rotta), Dona Odeteh, Black Stone, Thiago Cruz, Zé Pelin, Legião II, Consciência Suburbana, Sextrash e tantas outras que subiram naquele palco. Mas somente um nome subiu regularmente nesse palco desde do início, e era o próprio Graciano. Sempre acompanhado do seu violão e o Meteoro Jaguar de dois alto-falantes de 12″, esse seus fiéis escudeiros.

É bom lembrar que o Espaço Rock bar também recebeu alguns visitantes ilustres, passaram por lá artistas como banda Concreto, Ventania, Carne Nua, Andreas Kisser e Paulo Xisto (Sepultura) estes tomaram um gelada por lá e Podé (Tianastácia). Marcelo Rotta, artista aqui da região do Barreiro, em 2009 gravou um DVD no Espaço Rock bar, naquele momento ainda usava o nome artístico Marcelo Vilas. Ele já sabia da importância do espaço criado por Graciano e Reginaldo, e não perdeu a oportunidade de registrar seu trabalho ali.

Sempre atento as mudanças, Graciano e Reginaldo também organizavam transmissões de jogos dos campeonatos estaduais, nacionais e, claro, da copa do mundo. Nessas datas eles aproveitavam a oportunidade e colocavam bandas pra tocar após as transmissões.

Havia também eventos como festas de moto clubes, inclusive toquei em uma dessas com a banda Cuatro em 2015, organizada pelos motociclistas do Bizzorros do asfalto. Era aniversário do moto-clube e foi bom demais, com um ótimo churrasco, gente bonita e muita bebida por conta dos Bizzorros. Nesse dia ainda tocou a banda Dizzy Missy.

Durante os anos de atividade do Espaço Rock bar muitas vezes Graciano e Reginaldo abriram suas portas para eventos beneficentes, seja para arrecadação de alimentos ou em outras oportunidades para doações de roupas e agasalhos, lembro de também tocar em um desses eventos, acho que o ano era de 2015.  Por estar localizado dentro de uma área residencial, o bairro Santa Cruz, eles sabiam das necessidades da comunidade através de seus clientes e amigos, e ao abrir as portas do bar para esses eventos solidários contribuíam para um melhor bem comum de todos.

Revendo algumas das fotos na página oficial do Espaço Rock bar no Facebook, sinto uma saudade enorme daqueles tempos de aglomeração, quando a gente ainda podia sair sem se preocupar, pra tocar ou ver uma banda ao vivo no palco.

Nas fotos percebo no sorriso de cada um a alegria desses momentos compartilhados, percebo a importância do convívio social e o real valor da troca de experiências. Esse ato de compartilhar de vivenciar a vida em sociedade nos torna mais humanos e desperta o melhor em nós, assim eu acredito.

Durante os 10 anos de atividade o Espaço Rock bar foi um pouco disso tudo, encontro de amigos, festas e comemorações de aniversários, o primeiro palco de várias bandas, o primeiro contato de muitos artistas com um público, ali cara a cara.  Graciano e Reginaldo partilharam seu sonho com muitos desconhecidos que posteriormente tornaram-se amigos.

Nós que dividimos um dia esse espaço e palco, somos parte dessa história, e somos gratos por cada oportunidade que nos foi dada.
Obrigado Graciano e Reginaldo por nos deixar fazer parte desse sonho.

Obrigado a você que leu essa coluna, caso também tenha frequentado o bar e lembre-se de um momento que tenha vivido por lá, ou de uma banda que tenha se apresentado nesse espaço, deixe aqui seu comentário e partilhe sua história conosco.

Obrigado e até a próxima!

Ilustração em aquarela, Espaço Rock bar por: Douglas Tolentino